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"Ave Maria, cheia de graça, o Senhor é convosco. Bendita sois vós entre as mulheres, e bendito é o fruto do vosso ventre, Jesus. Santa Maria, Mãe de Deus, rogai por nós, pecadores, agora e na hora da nossa morte. Amém."

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quarta-feira, 16 de julho de 2014

ROMANCE DAS IGREJAS DE MINAS

 

"Minha alma sobe ladeiras,

Minha alma desce ladeiras

Com uma candeia na mão,

Procurando nas igrejas

Da cidade e do sertão

O gênio das Minas Gerais

Que marcou estas paragens,

Estas sombras benfazejas,

Estas frescas paisagens,

Estes ares salutares,

Lavados, finos, porosos,

Minerais essenciais,

Este silêncio e sossego,

Estas montanhas severas,

Esta antiga solidão,

Com o sinal do seu lirismo,

Com a cruz da sua paixão.

Templos de Minas Gerais.

Das cidades e arraiais,

Templos em pedra-sabão

De Sabará e Mariana,

De Ouro Preto, de Ouro Branco,

De Brumado a Catas Altas,

De Santa Rita Durão,

Santa Bárbara, Congonhas,

Cachoeira, São João del Rei,

Tiradentes, Caeté:

Quantas vezes meditei

Os novíssimos do homem,

Que o século não consome

Nem a ciência destrói,

Nesses templos soberanos,

De riscos audaciosos,

De curvas acentuadas,

De linhas voluptuosas,

Íntimos, doces, profanos,

Refinados, populares,

Que inspiram poesia e dó,

Nesses Carmos e Pilares,

Nesses Rosários e Dores,

Nesses Perdões e Mercês,

Em São Francisco de Assis,

Em Nossa Senhora do Ó!

Em capelinhas caiadas

Na colina levantadas,

Vestidas de branco e azul.

Minha alma desce ladeiras,

Minha alma sobe ladeiras,

Desce becos, sobe vielas

Com uma candeia na mão,

Procurando a forma altiva

Da cruz, viva tradição,

Pedra de ângulo, base

Da rude religião.

Diviso lívidos Cristos,

Diviso Cristos sangrentos,

Monumentos de terror,

O Cristo da Pedra Fria,

O Senhor da Cana Verde,

O Cristo atado à coluna,

O Senhor morto esticado

Envolto em roxo sudário

Debaixo do próprio altar.

Vejo agora mãos chagadas,

Nossa Senhora de espadas

Cravadas no coração,

Coroas de espinhos, vasos

Por onde escorreu o fel,

Tíbias, caveiras coroadas,

Pinturas já desmaiadas

Nas telas emolduradas

Em forma de medalhão,

Figurando o Paraíso,

A Trindade, a Anunciação,

O Lava-pés, o Batismo,

A Morte e a Ressurreição;

Relicários, oratórios,

Pelicanos de coral,

Sinistro baixo-relevo

Das almas do Purgatório

Libertas por São Miguel,

Longas lanças de Longuinho,

Atlantes do Aleijadinho,

Portas, púlpitos, profetas

Marcados por seu cinzel,

Redondos anjos barrocos

Que o toreuta retorceu,

Arabescos sensuais,

Apóstolos duros, secos,

Peregrinos medievais

Revestidos de amplos sacos,

Marchando com seu bastão;

Calvários extraordinários,

Tarja com estrelas e asas,

Tocheiros, lâmpadas, lustres,

Galerias, balaústres,

Grades em jacarandá,

Querubins, anjos-aurora

De estranhos panejamentos,

Com as asas espalmadas,

Lavabos de sacristias

Feitos de pedra-sabão,

Tetos altos do Ataíde

Exaltando a religião;

Paredes em faiscado,

Consistórios, corredores

Onde vagueiam fantasmas

De poetas inconfidentes,

De frades conspiradores;

Oleogravuras mostrando

A Via-Sacra da Paixão,

Carátulas, gárgulas negras,

Colunas tremidas, gregas,

Caixas pedindo dinheiro

Em antiquados letreiros

De oremus e ora pro nobis,

Ex-votos comemorando

Curas por intercessão:

E a nobre talha dourada,

Patinada, trabalhada,

As imagens ressaltando

De nossos oragos, tantos

Santos de esgarçados mantos,

De arbitrárias cabeleiras,

Roxas, pisadas olheiras,

Os membros caídos, feridos,

Desfeitos, desmilinguidos,

Contemplando comovidos

O descimento da cruz.

Minha alma sobe ladeiras,

Minha alma desce ladeiras

Com uma candeia na mão,

Ilumina embevecida

Seus santos de devoção,

Companheiros vigilantes

Da cruz da sua paixão,

Que deu corpo, força e vida

Aos templos de pedra-sabão:

São Pedro, Santo Isidoro,

São Gregório, São Leão,

Santa Bárbara, São Jerônimo,

São Paulo, Santa Juliana,

Sant'Ana, São Sebastião,

Santa Águeda, Santa Mônica,

São José, Santa Verônica,

São Francisco, Santa Clara,

São Policarpo, São João.

A igreja agora agasalha

Uma densa multidão

Que procura comovida

Nos mistérios redivivos

Da nossa religião

Novo alento, luz e vida,

Sustento, consolação.

Sinos de bronze ressoam,

Ressoam sonoros sinos:

Vejo figuras de orantes,

Orantes e comungantes

Com os abraços estendidos

Orando íntima oração:

Assim se vê nas pinturas

Das antigas catacumbas,

Nos mosaicos bizantinos,

Mulheres, moços, meninos,

Catecúmenos, anciãos,

Assim oravam outrora

Os primitivos cristãos.

Vejo beatos sofredores

Trazendo bentinhos, fitas,

Rezando gastos rosários,

De olhos fixados no céu,

Velhas bíblicas, severas,

Nos ombros escapulários,

Perfil talhado a formão,

Muitas vestem à maneira

De senhoras de outras eras

Com filó preto, fichu,

Dona Engrácia, Dona Urbana,

Don'Ana, Dona Juju;

Irmãos da santa Irmandade

Encostados às paredes,

Pensando na procissão,

Vaidosos nas opas verdes,

Vermelhas, brancas, violetas;

Pretos de vela na mão,

Pretinhas de laçarotes,

Rapazes em seus capotes

Cor de cinza e vermelhão,

Garotinhos retorcidos

Descendentes dos garotos

Que inspiraram o Aleijadinho

Nos anjos do medalhão.

A grande ação começou:

A sublime teologia

Revela a sabedoria

Do sacrifício inefável,

Do mistério universal

De que todos participam

Na terra, no ar, no céu,

Unidos na comunhão

Do Deus eterno, uno e trino,

De um só e mesmo batismo,

Uma só fé, um só pão.

Vozes ascendem aos ares

Que desprezam o cantochão,

Rompe um canto pela nave

A Santa Maria Eterna,

Um canto sentimental

Que ofende a liturgia,

Fonte viva, genuína,

Da santa religião,

Mas que toca a alma ingênua

Do povo rústico e chão.

Agora um baixo-profundo

Canta um hino de paixão,

Esconjura o diabo imundo,

Clama os pecados do mundo

Em longa lamentação,

Chorando com gravidade,

Chorando oculto nas grades

As saudades de Sião.

Mas chega a missa ao momento

De maior concentração,

Surdo silêncio se faz.

Abre-se agora o sacrário,

No seu recesso repousa

O Cristo em sua nova lei,

Já que o antigo documento

Cede ao novo testamento,

Cede ao novo mandamento,

Mistério de caridade.

Mistério de santidade

E total despojamento

O sacramento do altar,

Ação da Comunidade,

Saúde, força, sustento,

Ante o qual todo elemento

Se inclina para adorar.

O celebrante apresenta

À Santíssima Trindade,

Em nome da humanidade,

Ao Pai eterno clemente,

Ao Filho, Verbo humanado,

Ao Espírito Divino,

Unidos na caridade

Por um nó que não desata,

O corpo de Nosso Senhor

Na santa cruz imolado,

Vencendo assim o pecado

Pela presteza do amor.

O Cristo, homem compassivo,

Deus trasladado do Céu,

Transferido à dura terra,

Solidário na sua dor,

Se reparte nos fiéis

Que traçam cruzes nos ares

Relembrando a salvação,

Curvando-se ante os altares

Onde se aprende, esculpida,

Em silêncio oferecida,

Na talha e pedra-sabão,

Ao culto do Deus criador,

A história da Encarnação,

Paixão e Ressurreição

De Cristo Nosso Senhor.

Murmuram o Agnus Dei.

O celebrante despede

O povo, "Ite missa est",

Para este cumprir na rua

O que no templo aprendeu,

Depois lê meio apressado

O evangelho de São João,

Cosmogonia do Verbo;

E afinal com o povo todo

Recita a Salve-Rainha,

Santa e solene oração.

Senhora benigna e pura,

Mãe de esperança e doçura

A quem todos nós bradamos,

Gememos e suspiramos

Neste desterro do céu,

Os olhos consoladores,

Clementes, a nós volvei,

Vossos filhos pecadores,

E mais tarde nos mostrai,

Espelho de todo o bem,

Depois de serena morte,

A face do Cristo, amém.

A multidão se dispersa

Nos seus trajos domingueiros,

Cada um retorna ao lar.

Minha alma sobe ladeiras

De Ouro Preto e Mariana,

De Sabará e São João,

Evoca no ar lavado

O drama da Redenção.

Minha alma sobe ladeiras,

Minha alma desce ladeiras

Com uma candeia na mão,

Procurando comovida,

Procurando comovida

A cruz da sua paixão,

Que deu corpo, alento e vida

Aos templos de pedra-sabão.

Por isso escrevi um canto

Com palavras essenciais,

Baseado na beleza

Da antiga Minas Gerais,

Inspirado na grandeza

Da rude religião,

Princípio e fim da existência,

Essência da perfeição,

Origem de todo o bem,

Penhor de ressurreição,

Doutrina de vida inteira,

Em louvor do Cristo, amém."

(Murilo Mendes)



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